Falta de medicamentos e de tratamento para presos diagnosticados com Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis, interrupção de hormonização corporal, obrigatoriedade de mulheres trans e travestis terem os cabelos raspados e superlotação. Essa é parte da realidade de irregularidades da ala LGBT da penitenciária Professor Jason Albergaria, em São Joaquim de Bicas, segundo o relatório apresentado pela deputada estadual Andréia de Jesus (PSOL). As denúncias serão tema de audiência pública na próxima quinta-feira (12) na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O pavilhão onde está localizada a
ala LGBT da penitenciária, uma das primeiras a serem criadas no Brasil, tem
capacidade para receber 112 internos, mas acomoda, atualmente, de acordo com o
que a direção do local apontou para o relatório, 292 detentos. Deles, 74 são
transexuais ou travestis. No total, a penitenciária tem capacidade para 396
presos, mas abriga cerca de 808.
“Identificamos a situação de
morte em que os presos estão. A gente percebeu que tinham celas com seis camas
e 18 presos. São condições de violação de direito humano visível. Há uma
insuficiência da limpeza urbana nessa área, então o recolhimento de lixo fica
comprometido e gera infestação. Tem ainda a incidência de doenças sexualmente
transmissíveis”, afirmou a deputada.
De acordo com o relatório que
será apresentado em audiência pública na próxima quinta-feira, os detentos
diagnosticados com doenças sexualmente transmissíveis não têm recebido nem
medicamentos nem atendimento médico. Presos com doenças contagiosas, como tuberculoses,
também não são encaminhados a tratamentos. Equipes da prefeitura de Igarapé e
do Ceresp Betim realizaram alguns atendimentos, mas não foi suficiente. As
detentas em situação de transição, que estão em processo de acompanhamento
hormonal, ainda segundo a equipe da deputada, não têm tido a oportunidade de
realizar a manutenção do tratamento. A equipe também informou que todas as
agentes penitenciárias mulheres que trabalhavam no local foram transferidas
para o presídio de Vespasiano, o que faz com que detentas trans e travestis
passem por revistas diárias de agentes homens.
O relatório também aponta
denúncias de homofobia e agressões por parte dos agentes penitenciários. Os
detentos estariam, inclusive, sendo impedidos de realizarem exames de corpo de
delito nesses casos. Parte das agressões e comportamentos homofóbicos, contudo,
também vieram de dentro da ala, uma vez que foi observado que alguns presos se
autodeclaram LGBTS apenas para ocuparem as vagas e tentam voltar atrás depois,
demonstrando, de acordo com o relatório, um descontrole na regulamentação,
visto que basta uma autodeclaração para garantir a inserção no pavilhão.
Os demais presos fazem coro às
condições precárias. Eles informaram que a alimentação é ruim e insuficiente e
que às vezes comem pasta de dente devido a podridão das comidas ofertadas.
Afirmaram não receber atendimento médico e disseram que não há escola para
todos que estão no pavilhão. Também informaram não ter acesso a cobertores,
copos e chinelos e reclamaram a falta de cama e de condições e produtos de
higiene pessoal.
Além disso, foi observado que não
há coleta de lixo com caminhão na região, o que fez com que se criasse uma
infestação de ratos no presídio, fato que foi alvo de notificação para a
Secretaria Municipal de Saúde da cidade.
Defesa
Em nota, a Sejusp afirmou que o pavilhão destinado aos presos inseridos no programa LGBTQI+ conta com 142 vagas e abriga, atualmente, 218 detentas. Dessa forma, o índice de ocupação atual é de 1,53 presos por vaga, o que, “diante da realidade de superlotação do sistema prisional nacional, tem o melhor índice de ocupação das unidades do Estado”.
A Sejusp ainda afirmou que são improcedentes as denúncias de falta de medicamentos, de falta de produtos de higiene e, também, que transexuais e travestis estariam tendo os cabelos raspados. O órgão também negou problemas no abastecimento de água da unidade.
Sobre a profusão de doenças
sexualmente transmissíveis, o órgão afirma que a equipe de saúde da
penitenciária foi orientada a realizar a capacitação de teste rápido on-line e
posterior prático para facilitar o diagnóstico dos casos na unidade prisional.
Em relação à alimentação, a
Sejusp informou que há previsão contratual para a substituição da refeição em
caso de não adequação, desde que verificada pelo gestor do contrato, que é o
diretor da unidade prisional. Neste caso, a empresa tem até duas horas para
substituir o alimento.
Sobre a denúncia de que alguns detentos comem pasta de dente, não há comunicado por parte dos presos de tal situação. Sobre as denúncias de escolarização precária, a Sejusp informou que é ofertada a todos que se encaixem no perfil, alfabetização presencial e regular. Por fim, em relação às agressões, o órgão afirma que não recebeu denúncias por parte de presos sobre desvios de conduta por parte de servidores.
Fonte: Jornal O Tempo